Assim, esses poucos fundamentos devem ser
lembrados: o self é um não-self.
O self não é pessoal, ele é
universal. O self é o espaço ou
contexto no qual todos os 'posicionamentos' na
vida aparecem, ocorrem, aparecem. Ele é a tela
da vida, mas a tela em si mesma nunca aparece na
tela, ela não consegue. Tudo mais aparece nela.
Ela própria permanece escondida. Ela é pura
subjetividade.
Essa pura subjetividade é o objetivo maior que
todo mundo está buscando. Mas ele parece difícil.
Nós somos tão propensos a nos identificarmos
com os conteúdos. Em vez de buscarmos pelo
verdadeiro, nós criamos alguma coisa não
verdadeira, que é fácil. O artificial é
sempre fácil, você pode manufaturá-lo.
O seu ego é um fenômeno manufaturado. E uma
vez que você manufaturou o ego...Como o ego é
manufaturado? 'Eu sou um hindu' agora você está
a caminho de criar um ego. 'Eu sou bonito, eu
sou inteligente, eu sou isso, eu sou aquilo' você
está trazendo mais e mais tijolos para fazer a
prisão chamada ego.
E isso é o que seguimos fazendo por toda a
nossa vida. Ganhar mais dinheiro, ter uma grande
conta bancária, e o seu ego se sentirá mais
firme, mais apoiado, mais seguro. Torne-se
famoso: quanto mais as pessoas souberem a seu
respeito, mais você pensará que você é.
Daí a constante procura por atenção. Se ninguém
prestar qualquer atenção em você, você estará
reduzido a nada. Se você passar pela rua e
ninguém disser 'olá', se as pessoas
continuarem passando e nem mesmo notarem você,
de repente você irá sentir como se a terra
estivesse desaparecendo debaixo de seus pés.
O que aconteceu? Eles não estão alimentando o
seu ego. Mas as pessoas alimentam os egos entre
si, porque é assim que eles podem ser
alimentados. Alguém diz: 'Como vai?'. Ele na
verdade está dizendo: 'pergunte-me como eu
vou'. Ele está simplesmente pedindo por uma
gratificação mútua. E as pessoas gratificam
umas às outras. Uns dão apoio ao ego dos
outros: alguém elogia você e, em troca, você
o elogia.
É a isso que nós damos o nome de sociedade.
Ela depende da mútua satisfação e a maior das
satisfações parece ser a gratificação do
ego.
Daí as pessoas estarem muito interessadas em
política, porque a política pode gratificar
você como nada mais consegue.Se você tornar-se
politicamente poderoso, todo o país estará
agarrado em você; todo o país terá que
prestar atenção em você. Você poderá impor
a sua vontade sobre as pessoas, você terá
poder.
O poder de um político é o poder de violência.
Agora ele controla todo o mecanismo de violência;
ele controla a polícia, o governo, os
militares; ele controla tudo. Ele pode lhe impor
a sua vontade. É por isso que os políticos,
mais cedo ou mais tarde, tendem a se tornarem
violentos. Políticos no fundo desejam guerras,
porque somente na guerra um político se torna
um grande político. Se você der um giro através
da história irá ver isso.
Winston Churchill não teria sido um tão grande
líder, se não acontecesse a Segunda Guerra
Mundial. Nem Adolf Hitler teria sido tão
poderoso se não houvesse a Segunda Guerra, nem
Mussolini. A guerra criou o contexto: eles foram
capazes de serem tão violentos quanto possível.
Eles foram capazes de abater milhões pessoas,
de assassinar milhões pessoas.
As pessoas prestam atenção imediatamente
quando você é violento.. Se você vive uma
vida pacífica, nenhum jornal irá fazer
reportagem a seu respeito, em toda a sua vida.
Mas se você matar alguém ou cometer suicídio,
você estará imediatamente nos jornais. (...)
Lembre-se, o verdadeiro self nada
tem a ver com pessoas prestando atenção em você.
Observe a diferença: o falso self
precisa que os outros prestem atenção em você
e o verdadeiro self só precisa de
sua atenção, só a sua atenção é o quanto
basta.
Se você voltar a sua atenção para dentro de
si, você conhecerá o verdadeiro self.
Se você continuar procurando pela atenção dos
outros, você continuará vivendo numa falsa
identidade que está sempre pronta para
desaparecer se você não alimentá-la
continuamente. Ela tem que ser apoiada.
O ego não é uma entidade. Ele não é um
substantivo, ele é um verbo. Por isso eu digo
que ele é um 'egoing' (**). Você
não consegue ficar satisfeito com qualquer atenção
prestada a você. Você tem que pedir e desejar
mais. Você continua 'egoing'. É através
do 'egoing' que o ego consegue existir.
Ele é um processo e ele é tão falso, e suas
cobranças são tão feias! Ele é uma mentira.
Ele cobra mais e mais mentiras de você e para
gratificá-lo você tem que tornar-se
completamente falso. Você tem que tornar-se uma
personalidade.
Uma personalidade significa um fenômeno falso,
uma máscara. Você tem que tornar-se um ator.
Você não é mais uma pessoa verdadeira, você
não é mais autêntico. Você não tem qualquer
substância, você é apenas uma sombra. E por
causa dessa sombra, existe sempre o medo da
morte, porque a qualquer momento essa sombra
pode desaparecer.
O seu banco pode quebrar e você imediatamente
se acaba, você será ninguém. O seu poder pode
ser perdido porque existem outros competidores
empurrando você. Toda essa vida é um constante
empurra-empurra, daí existir tanta agonia.
Todo o mundo vive em angústia e agonia. Somente
a pessoa que vem a conhecer o seu verdadeiro self
vai além disso e entra no mundo do êxtase. E
esses são os dois estados: agonia e êxtase.
Parmita, você está em agonia, como todo mundo
está. E a busca é pelo êxtase. Lembre-se
sempre: seus compromissos, suas ideologias, os
seus chamados altos valores, suas teologias,
filosofias e religiões fornecem contextos,
muitas vezes contextos valiosos, para a existência
individual. Mas eles não são o que você é.
Você nem mesmo é o seu corpo. Você não é a
sua mente. Você não é branco nem negro; você
não é indiano nem alemão. Você não pode ser
definido de maneira alguma. Todas as definições
são insuficientes.Você é indefinível; você
é algo que supera todas as definições. Você
é o vasto céu no qual os planetas aparecem, e
a terra aparece, e o sol, a lua a as estrelas, e
todos eles desaparecem, e o céu permanece como
sempre permaneceu. O céu não conhece mudanças.
Você é aquele céu imutável. As nuvens vêm e
vão, e você permanece sempre ali. (...)
Se você quer buscar o verdadeiro self,
não se apegue a qualquer compromisso, a
qualquer programa ou a qualquer idéia. Permaneça
desapegado, flexível, fluido. Não se torne
estagnado. Permaneça sempre no estado de não-congelamento;
não congele. No momento em que você congela,
você tem alguma coisa falsa em suas mãos; uma
nuvem surgiu. Permaneça no estado de
derretimento, não se torne comprometido com
qualquer forma ou nome. E então, alguma coisa
tremenda começa a acontecer em você: pela
primeira vez você começará a sentir quem você
é. Esse sentir não vem de fora, ele surge da
profundidade mais interna de seu ser. Ele inunda
você. Ele é luz, completa luz; ele é êxtase,
completo êxtase. Ele é divino. Ele é um outro
nome de Deus.
Nunca se torne cristalizado. Se você se torna
cristalizado em alguma coisa, você está
encarcerado. Permaneça livre, seja a liberdade.
Toda identidade cria amarras; e toda amarra,
toda identificação é um comprometimento.
Quanto mais fixa é a identidade de alguém,
menos ele é capaz de experienciar. O ponto não
é não ter uma posição, o ponto é não ser
identificado com a posição.
Eu não estou dizendo para ficar sem pensar.
Permaneça inteligente e capaz de pensar, mas
nunca fique identificado com qualquer
pensamento. Use o pensamento como uma
ferramenta, como um instrumento; lembre-se que
você é o mestre. Não estar apegado a qualquer
posição que se tenha em qualquer momento
particular, é o começo do auto-conhecimento. A
pessoa é, ela experiencia a vida numa extensão
em que pode transcender posições particulares
e consegue assumir outros pontos de vista.
Isso é o que eu quero dizer por permanecer
fluido, fluindo. A pessoa deve permanecer disponível
para o presente. Morra para o passado a cada
momento, de modo que nada a seu respeito permaneça
fixo. Não carregue um caráter junto consigo.
Todo caráter é armadura, aprisionamento.
O verdadeiro homem de caráter é sem caráter.
Ele tem consciência, mas nenhum caráter. Ele
vive momento a momento. Ele é responsável, mas
ele responde a partir do momento e não a partir
de contextos passados. Ele não carrega qualquer
programa pré-fabricado em seu ser. Quanto mais
você tiver programas pré-fabricados, mais você
será um ego. Quando você não tem qualquer
programa, nada pré-fabricado em você, quando a
cada momento você é tão fresco como se
tivesse nascido novamente, para mim isso é
liberdade. E somente uma consciência livre pode
conhecer um verdadeiro self.
Essa é a busca, Parmita. Nada mais irá
satisfazer, nada mais poderá satisfazer. Tudo são
consolos e é melhor abandoná-los, é melhor
estar consciente de que consolos não irão
ajudar.
Isso é o que eu chamo sannyas: abandonar os
consolos, renunciar aos consolos, não ao mundo
mas aos consolos, renunciar a tudo o que é
falso, tornando-se verdadeiro, tornando-se
simples, natural e espontâneo. Essa é a minha
visão de um sannyasin, a visão de liberdade
total.
E em tais belos momentos de liberdade total, os
primeiros raios de luz entram em você, os
primeiros vislumbres de quem você é. E a
grandeza disso é tanta, e o esplendor disso é
tanto que você ficará surpreso ao descobrir
que você estava carregando o reino de Deus
dentro de você enquanto permanecia tão
inconsciente, e por tanto tempo. Você
ficará surpreso. Como foi possível não ter
conhecido tal tesouro? Um tesouro inesgotável
dentro de você.
Jesus seguia repetindo 'O Reino de Deus está
dentro de você'. Chame-o de reino de Deus ou de
supremo self, ou de nirvana, ou o
que você quiser, essa é a nossa busca, a de
todo mundo, não apenas dos seres humanos, mas a
de todos os seres. Mesmo as árvores estão
crescendo em direção a isso, mesmo os pássaros
estão buscando isso, mesmo os rios estão
correndo em direção a isso. Toda a existência
é uma aventura.
E essa é a beleza dessa existência. Se ela não
fosse uma aventura, a vida seria uma absoluta
chatice. Vida é celebração porque ela é uma
aventura.
OSHO - Unio Mystica - Discurso 2 -
pergunta 1
tradução: Sw.Bodhi Champak
(*) Preferimos manter a palavra 'self' em inglês,
sem traduzi-la, devido à dificuldade em se
encontrar um equivalente em português. Poderíamos
traduzi-la por 'eu', e faria muito sentido, mas
essa palavra traz em si uma conotação de ego,
o que poderia comprometer o sentido do texto. Em
muitas frases seria perfeito traduzi-la por
'ser', mas em outras frases, o sentido ficaria
estranho. Uma tradução mais literal seria 'si
mesmo', mas a leitura do texto também soaria
estranho em vários parágrafos. Assim,
preferimos manter a palavra 'self' em inglês
sem traduzi-la. Pedimos apenas que não a
confundam com a palavra self adotada na
literatura de psicologia em geral, na língua
portuguesa. Na ciência Psicologia, self tem
outra conotação. (N.T.)
(**)
'egoing' é um neologismo criado por Osho para
poder classificar a palavra 'ego' como sendo um
verbo e não um substantivo. O sufixo 'ing' em
inglês sugere que a palavra é um verbo e não
um substantivo. Não encontramos uma palavra em
português para traduzir 'egoing'. (N.T.)
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