Um homem nervoso, viciado em histórias
de fantasmas, leu, tarde da noite, uma história bem
escrita. Ele ficou com a sensação de que o fantasma,
sobre o qual estava lendo, estava na sua casa. Ele colocou
barricadas atrás da porta, tremendo de medo e correndo o
risco de ter um ataque cardíaco. Sob certo sentido, ele
sabia que tudo era ilusão, que ele apenas estava lendo
sobre aquilo. Essa é a sua ‘compreensão original’, a
qual não é totalmente perdida. Mas, na prática, ele
aceita o fantasma, e isso o afeta fisicamente. Qualquer
rangido dos móveis ou rajada de vento reforça sua crença
no fantasma.
Do ponto de
vista da compreensão original, não há nada que precise
ser feito, uma vez que o fantasma não existe. Mas do
ponto de vista da realidade prática, para se livrar do
medo que o oprime, ele precisa adotar uma disciplina que
impeça sua cabeça de ter pensamentos baseados na aceitação
da existência do fantasma, e possa assim retornar à sua
compreensão original. Mas se ele tiver que considerar
essa estratégia como uma espécie de magia para acabar
com o fantasma, ele de novo estará afirmando a sua existência
e atrapalhando a compreensão original.
Mesmo se disser
que o objeto dessa estratégia é livrá-lo do fantasma,
isso não faz sentido – o fantasma nunca existiu. A prática
da compreensão é o que naturalmente põe um fim a essa
questão. Os móveis rangem e o vento emite rajadas, mas a
casa sempre esteve em paz.
Esta é uma bela
história, e você já teve ter observado isso algumas
vezes, lendo, tarde da noite, uma história de fantasmas,
um conto de suspense, ou algo parecido. E você sabe,
basicamente você sabe, fundamentalmente você sabe, que
aquilo é apenas uma ficção. Mas você ficou envolvido
na história. Uma história de fantasma, se for bem
escrita, pode lhe provocar muito medo.
Você quer ir ao
banheiro e não consegue ir. E você sabe – não
é que você não saiba – você sabe que aquilo é
tolice. Mas a dificuldade prática surgiu. Você sempre
foi àquele mesmo banheiro no meio da noite e nunca teve
problema algum. Ora... Você vai dizer que não sabe? Você
esteve lendo a história do fantasma, e você sabe que
esse tal fantasma, que parece estar ali no banheiro, na
verdade não está.
Se você
conseguir entender esta história, terá entendido todo o
ponto de vista do Zen. O ego é o fantasma. Ele não está
ali. E você sabe disso! Mas a dificuldade prática
existe. Você sabe disso, mas ainda assim... O vento vem e
faz um barulho, as folhas secas sobre o jardim estão
sendo levadas para cá e para lá pelo vento, e você
sente… ou imagina que são passos de alguém. Um rato
corre dentro do banheiro... Alguma coisa cai... Isso lhe dá
um susto. E você está sozinho
em casa... E
a história do fantasma em suas mãos... Você está sob
esse impacto. Agora a sua bexiga está cheia, a ponto de
estourar! E você não consegue ir ao banheiro.
E você sabe, o
tempo todo, que são apenas folhas secas, e que o vento
sempre as espalha desse jeito. E você sabe que o rato, de
vez em quando, faz coisas no banheiro. Mas quem sabe...?
Talvez...? Esse talvez dá vida real a algo que é apenas
fantasia de sua imaginação.
Você pode agora
ir a um Mestre, ou pode recitar um mantra, ou pode começar
a entoar ‘Ram, Ram, Ram’ para ajudá-lo. Ora, o
primeiro fantasma é falso, e o segundo fantasma também
será falso. Você está agora chamando por Deus,
‘Ajude-me!’ ou recitando um mantra porque a bexiga está
cheia, a ponto de estourar, e você tem que ir ao
banheiro. E você precisa de se livrar desse fantasma de
algum jeito. E alguém lhe disse que o nome Ram é muito
poderoso, Você tem ouvido histórias. Agora, todas essas
histórias se tornam dignas de confiança. Você ouviu que
alguém estava passando perto de um cemitério e um
fantasma começou a segui-lo, e ele começou a dizer
‘Ram, Ram, Ram’, três vezes – e o fantasma se foi e
ele pode atravessar o cemitério sem qualquer
problema.
Todas essas histórias
agora... E a sua mente está numa confusão! Você começa
a repetir ‘Ram, Ram, Ram’. Você tem que ir ao
banheiro, tem que encontrar um jeito ou outro de ir. A
bexiga está estourando, e então você diz, ‘Ram, Ram,
Ram’ – sacudindo, tremendo, metade acreditando, metade
não acreditando. E você vai ao banheiro. Ram ajudou.
Na verdade não
existe fantasma algum, por isso não há necessidade de
Ram ajudá-lo. Mas Ram ajuda. E você fica muito feliz por
Ram tê-lo ajudado. Assim, esse mantra é poderoso. Agora,
um fantasma foi abandonado, e um outro fantasma está
presente. Agora você vai ficar apegado a esse nome
‘Ram’. Agora, sempre que você estiver com medo irá
entoar ‘Ram’.
De uma tolice
para outra tolice... De uma falsidade para outra
falsidade.
Esta é a
abordagem do Zen: ao invés de substituir seus fantasmas,
por favor, veja, antes de tudo, o fato de que não existe
fantasma. Por isso não há necessidade de ficar
dependente de qualquer mantra, de qualquer Deus, não há
necessidade de se ficar dependente de quem quer que seja.
Simplesmente veja: a doença que você acha que tem, não
existe, por isso nenhum medicamento é necessário.
Vendo a
realidade de que você é a sua quietude original –
agora, neste exato momento, vocês são deuses e deusas
– vendo isso, a história de fantasma que você tem lido
por milhões de vidas, simplesmente desaparece, sem deixar
qualquer rastro. Isto é o que o povo Zen chama de face
original ou compreensão original.
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