Conexão Brasil                        abril de 2008
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O êxtase interno

 

    Querido Osho,  
    Você é iluminado há quase trinta e seis anos. Como é sentir-se além do além do além?
    P.S. Podemos nos encontrar mais tarde num bar?

    “Vimal, parece que você bebeu demais, porque nós já estamos no bar! Este lugar somente pode ser descrito como pertencente àqueles que estão embriagados com o divino... Tão embriagados que esqueceram suas nacionalidades, suas igrejas, esqueceram até mesmo quem eles são.
    O Vimal está me perguntando se eu posso encontrá-lo mais tarde num bar, mas além deste bar aqui não existe outro lugar tão embriagado com a dança e com a canção divina. O que eu estou lhe ensinando é encontrar a fonte dentro de si mesmo que pode torná-lo um bêbado. 
    A alegria desta vida, a felicidade e o êxtase pertencem apenas àqueles cujo vinho não vem de fora – esse é muito efêmero, muito temporal, feito com o mesmo material que os sonhos são feitos. Existe um outro vinho que se desenvolve dentro de você. No momento em que você começar a se mover para dentro, não haverá mais necessidade de coisa alguma para torná-lo alheio a todas as misérias que o rodeiam. Não haverá necessidade alguma de qualquer outra droga. 
    Uns poucos idiotas no Ocidente começaram a chamar uma droga de ‘êxtase’. Bem, isso é absolutamente contrário a todas as leis do mundo, porque êxtase tem sido por séculos um direito autoral do meu povo! E o êxtase não é uma droga externa, ele flui no próprio sumo da vida. Você não tem que mover nem mesmo uma polegada; onde estiver, você poderá estar rodeado por todas as possibilidades de felicidade. E essas possibilidades de felicidade não são temporais; e você não terá uma ressaca amanhã de manhã. Quanto mais você bebe, mais sóbrio, mais sadio, alerta e consciente você se torna.
    A não ser que uma droga seja encontrada dentro do seu ser, é muito provável que você vá procurá-la em algum outro lugar. Isso levanta uma questão tremendamente significante. Quanto mais pudermos voltar no tempo, e nos lembrar da história humana, a mais velha e mais antiga escritura é o Rig Veda dos hindus, e ela fala de uma certa droga, o somrasa.
    Um dos homens mais inteligentes do século XX, Aldous Huxley, ficou muito interessado em pesquisar o que era esse somrasa, porque os videntes do Rig Veda costumavam bebê-lo e dançar ao redor do fogo. Certamente parece que devia ter sido uma droga, e particularmente para o pensador ocidental objetivo, não poderia ser outra coisa senão uma droga. 
    Aldous Huxley experimentou todos os tipos de drogas e finalmente decidiu que o LSD parecia chegar muito próximo da descrição do somrasa. Na esperança de que no futuro o LSD fosse mais refinado – porque ele é uma droga sintética, manufaturada; então havia toda possibilidade dele ser melhorado, tirar dele todos os ingredientes que pudessem ser danosos e deixar apenas aquilo que pudesse trazer saúde, totalidade, consciência e um tremendo insight sobre os mistérios da existência... Esperando que algum dia os cientistas fossem descobrir isso, Huxley já o havia denominado de soma, apenas para demonstrar respeito aos antigos videntes do Rig Veda.
    Mas Huxley estava profundamente equivocado. O somrasa que é descrito no Rig Veda é certamente uma droga como a maconha que era uma planta nativa nos Himalaias. Talvez ele ainda cresça lá, mas nós não temos sido capazes de encontrar o local onde ele cresce.

    E o fogo ao redor do qual eles dançavam, nada tinha a ver com o fogo interno da vida. Eu tenho pesquisado o Rig Veda muito profundamente, com toda a compreensão possível. As pessoas, que ali falam sobre o somrasa e o ritual do fogo, estavam sacrificando até seres humanos, para não mencionar o sacrifício de outros animais. Os hindus, que estão continuamente criando problemas neste país por causa de sua insistência para que se pare com a matança de vacas, deviam ler suas antigas escrituras. Todos os seus sacerdotes matavam vacas em sacrifício ao deus fogo, e todos eles comiam a carne das vacas. Ora, não se pode dizer que essas pessoas sejam meditativas. 
    Eu nego absolutamente o Rig Veda e o prestígio que ele tem na mente dos homens. Porque as pessoas não o lêem e não o analisam, não vêem as suas estupidezes e todos os tipos de desumanidades.
    No Rig Veda as mulheres eram simples mercadorias. Você podia comprar mulheres em qualquer leilão do mercado. Mesmo os chamados videntes tinham muitas esposas, e eles não se 

satisfaziam com isso. É um estado totalmente feio, esse em que um ser humano qualquer possa reduzir muitas mulheres a um monte de vacas, a um gado. Acima e além de tudo isso, eles estavam continuamente nos leilões comprando belas garotas.
   
As pessoas se esqueceram – o tempo muda, as palavras assumem um novo colorido. Agora na Índia a palavra wadu simplesmente significa uma mulher recentemente casada. Mas nos tempos do Rig Veda, wadu significava uma mulher que tinha sido comprada recentemente no mercado. Todos os chamados videntes tinham dois tipos de mulheres: um grupo era formado pelas suas esposas e o outro, pelas wadus. A palavra wadu não é respeitável; ela simplesmente significa uma prostituta, comprada – uma mercadoria, não um ser humano. Ela podia ser vendida a qualquer momento. 
    E o que causa espanto é que as crianças nascidas da esposa eram os filhos legítimos e as crianças das mulheres compradas não eram legítimas. É incalculábel o tanto de desumanidade que o homem tem feito a outros seres humanos. Como pode uma criança ser ilegítima? Os pais podem ser ilegítimos, mas não uma criança. Toda criança é tão inocente quanto qualquer outra. Não importa se a criança nasceu de uma prostituta ou de uma mulher comprada ou de uma mulher casada. Em todos os casos a criança é absolutamente legítima. Mas as pessoas são muito espertas em jogar as suas responsabilidades para os outros. Os pais nunca são chamados de ilegítimos. Crianças são chamadas de ilegítimas. 
    Aqueles videntes acumularam imensa riqueza, tinham muitos escravos, costumavam comer carne – eu não posso conceber que eles tenham encontrado o êxtase interior sobre o qual eu estou falando. Todas as evidências circunstanciais são contra eles. E veja as suas preces – elas são tão estúpidas que as pessoas se sentem envergonhadas de que eles sejam chamados de grandes videntes. Suas preces estão no Rig Veda e noventa e oito por cento do Rig Veda consiste em preces. Somente dois por cento podem ser arrumadas, limpadas, interpretadas de uma maneira que faça algum sentido. Por outro lado, noventa e oito por cento consiste em tal tipo de prece que vocês não acreditarão...
    Um vidente está rezando a Deus, tomando aquele antigo LSD do Aldous Huxley, ‘Desta vez, meu Deus, escute a minha prece: as suas nuvens devem chover apenas sobre os meus campos e não sobre os campos de meus inimigos. Você nunca tem me escutado, mas desta vez eu estou sacrificando muitas vacas, muitos cavalos, e você tem que me escutar. Dê mais filhos para mim e não dê um simples filho para meus inimigos.’ E quem são os inimigos? – os outros videntes. E todos eles estão rezando. Preces que parecem tão estúpidas... ‘Se você tem compaixão, me dê uma prova: o leite das vacas de meus inimigos devem secar.’
    Essas são as pessoas religiosas? ‘Dê a vitória para mim e para meus amigos; e dê a derrota para meus inimigos e para os amigos deles.’ Eu não consigo pensar que essas pessoas sejam meditativas. Aldous Huxley estava totalmente errado. Somrasa nada mais era que alguma droga horrível; talvez ela possa ter sido maconha, porque ela ainda cresce em Kulu Manali e em outras partes dos Himalaias. Lá não é preciso cultivá-la, ela cresce naturalmente. Aqueles são os locais onde o Rig Veda foi composto.
    No que me diz respeito, o meu interesse é que, apesar de todos os governos, todas as religiões do mundo e todos os professores de moral terem estado contra as drogas, elas estão predominando hoje mais do que jamais estiveram. Quanto mais elas têm sido condenadas, proibidas, colocadas fora-da-lei, mais atraentes elas têm se tornado. As pessoas costumavam beber e tomar drogas a partir de uma certa fase, mas a última informação da Califórnia é que crianças na escola estão usando drogas, e que garotos e garotas estão sofrendo detenções porque foram pegos usando drogas.
    Esta é uma história estranha – todas as religiões são contra as drogas, todos os governos são contra as drogas, todos os professores e os moralistas também, mas a influência das drogas continua aumentando. Deve haver alguma coisa mais profunda nisso, além do que as pessoas estão vendo. 
    O meu entendimento é que, a não ser que o homem encontre uma droga dentro de si mesmo, a qual eu chamo êxtase, ele continuará procurando algum tipo de droga substituta no mundo externo. Somente a meditação pode fazer uma pessoa parar de usar drogas. Nenhuma lei consegue proibi-las – todas as leis fracassaram. Apenas criaram hipócritas. 
    Eu não sou contra o êxtase, mas quando eu digo êxtase, eu não me refiro a essa droga que está disponível no mercado. Eu quero dizer o êxtase com o qual você nasceu, aquele que você ainda carrega dentro de si e no qual ainda não tocou. Com apenas uma pequena degustação dele, tudo mais do lado de fora imediatamente se torna sem sentido. 
    Você tem a fonte do êxtase infinito dentro de si.
    Sim, eu ensino vocês a serem bêbados, mas a sua bebida tem que vir do seu próprio centro mais interno. E a diferença pode ser facilmente compreendida: toda droga externa torna você inconsciente, viciado, e todo tempo você precisa de mais e mais, porque o seu corpo se tornará imune a ela.

  Ainda hoje, na Índia, existem umas poucas tradições antigas que caíram na mesma falácia como Aldous Huxley. Mas elas foram mais longe que Huxley; as pessoas tomam todo tipo de bebida alcoólica e usam todo tipo de drogas. Chega um momento em que nenhuma droga consegue torná-las inconscientes, nenhuma droga consegue levá-las àquilo que elas têm tentado encontrar – uma maneira de esquecer de si mesmas, esquecer da miséria do mundo, esquecer de todo esse povo. O último recurso é aquele que existe nos Ashrams em Assam; eles são os únicos remanescentes de uma tradição muito antiga. Eles mantêm cobras naja como um último recurso – quando nenhuma droga afeta mais você, é permitido que a naja

dê uma picada na sua língua. Somente assim você se sente um pouco chocalhado, mas o que causa espanto é que a naja morre. O homem está tão cheio de veneno... Mas, a pobre naja não sabia, senão ela teria escapado.
   
Eu tenho me perguntado porque o homem permaneceu tão interessado em venenos. A razão não está muito longe; é preciso apenas clarear um pouco. O homem está tão miserável que ele não consegue viver conscientemente com essa miséria. Ele precisa de umas pequenas pausas, pelo menos uns dias de férias dessa angústia miserável, dessa ansiedade e de todas essas torturas. As drogas têm sido uma tremenda ajuda. Mas não apenas as drogas químicas – Karl Marx está correto quando diz que as religiões do mundo nada mais são que ópio do povo. Essas religiões têm provado ser um consolo. Elas têm dado uma esperança, elas apresentam um certo futuro e tiram sua consciência do presente e da sua miséria. Essa é a função de qualquer droga. 
    O meu esforço aqui, Vimal, é fazê-lo abandonar todos os futuros, todas as esperanças, todas as ilusões, e simplesmente relaxar neste momento, sabendo perfeitamente bem que este é o único momento que existe. Tudo mais é memória ou imaginação. 
    Aquele que está no presente, imediatamente mergulha em seu próprio poço... Um poço de algo que não é venenoso, mas que é certamente extático. E uma vez que você conhece a sua própria fonte, não há necessidade alguma de ir a qualquer outro lugar, a qualquer bar ou a qualquer igreja ou a qualquer templo.

    O jovem médico, inexperiente em operações, foi instruído para ficar de pé na cabeceira do paciente de modo que, sem perturbar o caminho, ele pudesse observar o especialista fazer uma operação abdominal. Ele também foi instruído a não falar. Mas, depois de um certo tempo, ele não resistiu e disse: ‘Como está essa parte aí, senhor?’. ‘Tudo bem’, disse o especialista, ‘Por que?’
    ‘Eu só queria saber, senhor,’ disse o rapaz, ‘porque esta parte aqui em cima já está morta há dez minutos.’
    Ele tinha permanecido em silêncio porque lhe foi dito para não falar. O homem estava morto e o cirugião continuava a operação.

    Existem algumas coisas, sobre as quais todas as tradições proibiram as pessoas de falar, e é preciso uma imensa coragem para ir contra toda a tradição da humanidade. Por exemplo, foi dito a todo mundo para não dar apoio a nenhum tipo de droga, de maneira alguma, e as pessoas têm permanecido em silêncio. Eu nunca soube de uma simples declaração de alguém que ousou dizer que a predominância das drogas demonstra algo imensamente significante e que elas não podem ser simplesmente colocadas fora-da-lei; não podem ser simplesmente proibidas. Mas eu quero declarar isso.
    Deixem que isso fique registrado: a não ser que o homem encontre a droga autêntica, que está em seu próprio ser, não existe força alguma na terra que possa proibir o álcool, que possa proibir a maconha, que possa proibir o haxixe, que possa proibir o LSD. Mais e mais drogas surgirão e o que causa espanto é que as pessoas que estão tentando proibir essas coisas – noventa por cento delas, elas próprias são usuárias de drogas. 
    Há poucos dias, aconteceu uma conferência internacional de homossexuais na América, e um membro do parlamento inglês representava os homossexuais ingleses. Ele é membro do parlamento e certamente ele é homossexual, senão, por que iria ser o representante deles? E, na conferência, ele disse, ‘Vocês devem estar pensando que eu sou uma pessoa estranha, sendo um membro do parlamento e representante dos homossexuais, mas eu quero que vocês saibam que pelo menos cinqüenta e seis membros do parlamento inglês são homossexuais.’ Eles podem não ter a coragem de externar isso. E são essas pessoas que fazem leis contra a homossexualidade!
    Talvez vocês nunca tenham pensado sobre isso, mas Jesus bebia álcool e nenhum cristão tem a coragem de dizer que um homem com as qualidades de Jesus não deve beber álcool. Só é possível ele procurar o álcool externo, se ele não encontrou o álcool interno. Toda noite ele ia a uma festa – e é estranho que mesmo depois de dois mil anos as pessoas bebem álcool em nome de Jesus. Naturalmente, se Jesus pôde ser um alcoólico, por que fazer essa proibição? Se mesmo Jesus precisava dele, então eu não acho que alguém possa estar numa posição de não precisar. (...)
    Vimal, o jeito de me entender é lembrar sempre que eu estou insistindo – por todos os lados e de toda maneira possível – somente num simples alvo, que é o seu ser mais interno. Qualquer coisa que eu tenha dito, não se preocupe muito com o que eu digo. Preocupe-se com aquilo que minhas palavras indicam.
    Eu quero que você abandone todos os jogos – jogos mundanos, jogos espirituais, jogos que toda a humanidade tem jogado até agora. Esses jogos mantêm você retardado. Esses jogos o impedem de crescer em consciência, em seu próprio florescimento supremo. Eu quero que você corte todo esse lixo que o impede.
    Eu quero deixá-lo só, absolutamente só, de modo que você não possa ter a ajuda de ninguém, de modo que você não possa se agarrar a nenhum profeta, de modo que você não possa pensar que o Goutama Buda vá salvá-lo. Ficando só, completamente só, é muito provável que você encontre o seu centro mais interno.
    Não há caminho algum, lugar algum para se ir, nenhum conselheiro, nenhum professor, nenhum mestre. Isso parece difícil, parece áspero, mas estou fazendo isso porque amo vocês e as pessoas que não fizeram isso, não amaram vocês de jeito algum. Elas amaram a si mesmas e amaram ter uma grande multidão ao redor delas – quanto maior a multidão, mais elas se sentiam nutridas em seus egos. 
    Eis porque chamei a própria iluminação de o último jogo. Quanto mais cedo você abandoná-lo, melhor. Por que não, simplesmente ser? Por que correr desnecessariamente para cá e para lá? Você é o que a existência quer que você seja. Apenas relaxe. “

                          OSHO – Om Mani Padme Hum - Cap. 9 – Pergunta 1
                         
Tradução: Sw. Bodhi Champak

   

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