Passei
muitos anos sem voltar a Puna, talvez por achar que não haveria mais o que
aprender por aqui. No ano passado, durante uma viagem pela Índia e Nepal,
resolvi passar pelo ashram só para ver o que estava acontecendo. Me diverti
tanto que resolvi voltar este ano. Desta vez, não foi apenas diversão, pois
tive muitas experiências e compreensões novas que mudarão a minha vida.
Mais uma vez. Um amigo me disse que o sinal de que este lugar continua vivo é
que o ashram sempre lhe dá o que está precisando no momento. Entretanto, não
vejo isso acontecer com todo mundo. Tenho ouvido com certa frequência que o
Resort foi uma decepção, que não é o que esperavam, etc.
Parece-me que “algo” acontece somente para quem, de alguma forma, se
envolve com totalidade na vida do Resort. A primeira camada geralmente é a da
diversão, parte integral da vida do ashram criado pelo Osho. Oportunidades
para dançar, conhecer pessoas, encontrar um(a) namorado(a) não faltam. Além
dos grupos, onde sempre existe a oportunidade de um contato profundo acontecer
mais rapidamente, existem festas disco duas vezes por semana, meditações
sociais, como a AUM Meditation, criada pelo Veeresh, e outras. Mas, uma
vez esgotada a camada da diversão, se não me envolvo no ashram mais
profundamente através das meditações, grupos ou trabalho-meditação, sinto
que “empaco” em algum ponto e começo a ver problemas em tudo: na poluição
e no ruído do lado de fora (às vezes dentro do ashram também), no tédio em
fazer as mesmas coisas todos os dias, encontrar as mesmas pessoas, etc. Esta
também é a hora em que muita gente vai para Goa para continuar com a diversão.
Entretanto, existe uma “mágica” que parece
funcionar aqui de maneira mais intensa. Tudo o que acontece, quase todas as
pessoas que encontro parecem ser espelhos de uma realidade interior que estou
vivendo. Depois que meu treinamento em pintura terminou e minha namorada
voltou ao Brasil, me senti “travado”, triste, solitário, sem energia para
me relacionar com ninguém. Então, comecei a fazer mais meditações, voltei
a fazer Dinâmica depois de muitos anos e, de repente, todas as pessoas que
encontrei “por acaso” pareciam estar dizendo ou mostrando algo (bom ou
ruim) que eu precisava enxergar justamente naquele momento.
Certo dia, eu estava sentado no jardim,
escrevendo alguns trechos do discurso matinal do Osho que, naquele dia, era
sobre tantra e a transformação do sexo em amor e em meditação, quando uma
facilitadora de grupos, vestida com seu robe preto, se aproxima de mim e diz:
“Você gostaria de se juntar a um grupo?” Surpreso, perguntei que grupo
era, quando, etc., para saber se valia a pena. Ela simplesmente disse: “Sim
ou não? Tem de ser agora.” Respondi que sim, e lá fui eu sem saber
exatamente o que me esperava. Quando entro no salão do grupo, para meu
espanto, era um trabalho sobre tantra! Estavam precisando de um homem para
fechar o número certo de casais.
Aqui não existem acasos. Participando de
grupos, dançando numa festa, jogando ping-pong na área de lazer e esportes
do Resort, conversando de maneira mais “social” com desconhecidos na hora
do almoço ou de maneira mais íntima e pessoal com algum amigo ou amiga
especial, praticamente todas as situações se tornaram espelhos e me ajudaram
a descobrir novas coisas sobre mim. Minha alegria voltou, a poluição, o ruído,
as mesmas pessoas deixaram de ser inconvenientes e passei a novamente a
enxergar a beleza deste lugar, da música, da dança, da meditação, do espaço
de amizade e amorosidade que pode brotar a cada encontro. Até mesmo o poluído
céu de Puna ficou azul! Compreendi que tudo é um espelho do que se passa
interiormente. Mas parece que a “cola” que permitiu unir estas diferentes
situações e dar uma compreensão sobre o que estava acontecendo comigo, que
permitiu enxergar a mim mesmo em eventos triviais ou mais profundos, foi a
meditação.
Geralmente tento equilibrar um ponto de vista
pessoal com descrições mais objetivas sobre o que anda acontecendo no
ashram, mas desta vez não pude evitar. Escrevi praticamente apenas sobre o
que aconteceu comigo. Mas o que fazer? Tudo aponta para dentro. Percebi que
algumas das minhas críticas sobre “os outros” nas minhas colunas
anteriores, sobre as pessoas presas ao passado de um outro ashram, eram na
verdade sobre mim mesmo.
Revisando
o que acabo de escrever, comecei a me questionar novamente. E se tudo for
mesmo um acaso e apenas enxergamos o que queremos ver e, ao enxergarmos algo,
damos a este algo a qualidade de “isto realmente tinha de acontecer” ? Será
que existe algo como sincronicidade ou é uma criação da nossa imaginação?
Será que agora estou apenas fazendo uma gibberish, uma fala sem
sentido? Ou será simplesmente que não quero terminar a coluna porque curti
muito escrever sobre Puna nos últimos meses? Hora de arrumar as malas...
Ansu
PS:
Aqui não cai uma gota de chuva em março, mas o título me pareceu irresistível.
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